Para comemorar o Dia Internacional dos Povos Indígenas é fundamental lembrar do Marechal Rondon, de origem indígena por parte de seus bisavós paternos e da bisavó materna. Percorreu mais de 100 mil quilômetros abrindo caminho por este Brasil afora. Foi responsável pela elaboração das cartas geográficas de cerca de 500 mil quilômetros quadrados deste mundão brasileiro. Fundou o Serviço de Proteção ao Índio, propôs a fundação do Parque Nacional do Xingu e inaugurou o Museu Nacional do Índio. Chegou a ser indicado para o Prêmio Nobel da Paz, em 1957.
Foi o espírito aventureiro e destemido de Cândido Mariano da Silva Rondon, o marechal patrono das comunicações do Exército Brasileiro, que abriu caminho para mudar a realidade de um Brasil litorâneo. Nos livros de História do Brasil, a constatação que se segue, feita em 1622, é bem conhecida:
"Da largura que a terra do Brasil tem
para o sertão
não trato, porque até
agora não houve
quem a andasse,
por negligência dos portugueses
que,
sendo grandes conquistadores de terras,
não se aproveitam delas, mas contentam-se
de as
andar arranhando
ao longo do mar como caranguejos”.
(Frei Vicente de Salvador)
Carlos Drummond de Andrade fez ao grande brasileiro que foi Marechal Rondon uma bela e justa homenagem, com os versos que se seguem. De minha parte, uma singela lembrança em forma de Haicai sobre essa belíssima foto (acima) de Santi Asef. E, de Caetano Veloso, a maravilhosa canção Um Índio, nas voz de Milton Nascimento.
Pranto Geral dos Índios
Carlos Drummond de Andrade
Chamar-te
Maíra Dyuna
Criador seria mentir
pois
os seres e as coisas respiravam antes de ti
mas
tão desfolhados em seu abandono
que
melhor fôra não existissem
As
nações erravam em fuga e terror
Vieste
e nos encontraste
Eras
calmo pequeno determinado
Teu
gesto paralisou o medo
tua
voz nos consolou, era irmã
Protegidos do teu braço nos sentimos.
O
akangatar mais púrpura e sol te cingiria
mas
quiseste apenas nossa fidelidade.
Eras um dos nossos voltando às origens
e
trazias na mão o fio que fala
e o
foste estendendo até o maior segredo da mata
A piranha a cobra a queixada a maleita
não
te travavam o passo
militar
e suave
nossas
brigas eram separadas
e
nossos campos de mandioca marcados
pelo
sinal da paz
E
dos que se assustavam pendia o punho
fascinado
pela força de teu bem-querer
Ó
Rondon, trazias contigo o sentimento da terra.
Uma
terra sempre furtada
pelos
que vêem de longe e não sabem
possuí-la
terra
cada vez menor
onde
o céu se esvazia da caça e o rio é memória
de
peixes espavoridos pela dinamite
terra
molhada de sangue
e de
cinza estercada de lágrimas
e
lues
em
que o seringueiro o castanheiro o garimpeiro o
bugreiro
colonial e moderno
Celebram
festins de extermínio
Não
nos deixaste sós quando te foste
Ficou
a lembrança, rã pulando n’água
do
Rio da Dúvida: voltarias?
Amigos
que nos despachastes contavam de ti sem luz
antigo,
entre pressas e erros, guardando
em
ti, no teu amor tornado velho
o
que não pode o tempo esfarinhar
e
quanto nossa pena te doía
Afinal já regressas. É janeiro
tempo
de milho verde. Uma andorinha
um
broto de buriti nos anunciam
tua
volta completa e sem palavra
A
coisa amarga
Girirebboy
circula nosso peito
e
Karori a libélula pousando
no
silêncio de velhos e de novos
é
como o fim de todo movimento
A
manada dos rios emudece
Um
apagar de rastros um sossego
de
errantes falas saudosas, uma paz
coroada
de folhas nos roça
e te
beijamos
como
se beija a nuvem na tardinha
que
vai dormir no rio ensanguentado
Agora
dormes
um
dormir tão sereno que dormimos
nas
pregas de teu sono
Os
que restam da glória velha feiticeiros
oleiros
cantores bailarinos
estáticos
debruçam-se em teu ombro
ron
don ron don
repouso
de felinos toques lentos
de
sinos na cidade murmurando
Rondon
Amigo e pai sorrindo na amplidão.
Amigo e pai sorrindo na amplidão.
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