Minha
mãe Iracema ligou hoje, bem cedo. Faz hoje 70 anos que sua mãe Celina foi embora deste mundo, deixando-a órfã com menos de nove anos de idade.
Dona Ira disse que chorou muito ao sair da missa matinal de domingo, que deu
uma saudade imensa dos tempos de criança, de uma infância repentinamente
colocada fora dos trilhos. Achou estranho todo esse sentimento a essa altura da
vida...
Saudade
não tem idade. Disse a ela, sem deixar de sublinhar que as lágrimas, vindas com
esses sentimentos tão puros e autênticos, são parte do caráter das pessoas grandiosas,
que têm bons exemplos a dar aos seus e a todos que com elas convivem. E ela
está plenamente inserida nesse rol de seres humanos.
Saudade é uma palavra
diretamente associada às emoções. Talvez, por isso mesmo, o dicionário Aurélio
traz a seguinte definição: Recordação suave e
melancólica de pessoa ausente, local ou coisa distante, que se deseja voltar a
ver ou possuir.
Por
ser assim tão associada às emoções, sobre ela criou-se o mito de que só existe
essa palavra para expressar tais sentimentos em Português. Em alemão (ajuda aí,
Ana Laura Campos!), existe a palavra sehnsucht, que tem esse entre
outros significados. Em polonês, a palavra tesknota tem sentido igual. Claro, as palavras
mudam de significado, expressam a mesma coisa com colorações diferentes,
dependo do contexto, de questões culturais e outras variáveis.
Mais isso não tem maior importância. O que tentei dizer para dona
Iracema, nesta manhã de domingo, foi o seguinte: o que interessa mesmo é o fato
de saudade ser uma palavra deliciosa, sonora, poética e agradável. Ninguém fica
triste porque sente saudade. É um sentimento um pouco diferente, mais em
direção do nostálgico, que nos faz viajar no tempo e no espaço, superando
distâncias, na maioria das vezes à velocidade da luz. Ficamos tristes quando
perdemos um ente querido, é verdade. Mas o sentimento não é exatamente esse
quando sentimos saudade dessa pessoa.
Falar
sobre saudade é tão difícil. Muito mais fácil é senti-la a nos envolver, de
maneira suave, gentil, como se fosse uma velha companheira que sempre esteve
entre nós e não pretende, jamais, nos deixar. Mas, ela vai embora da mesma
forma que chegou, suavemente, sem arrancar pedaços...
Mãe, dona Ira, ter saudade é bom
demais da conta!
Saudade
José Carlos Camapum Barroso
Quero sentir saudade,
Mas a noite não deixa.
O latido do cão assusta,
A escuridão domina
O brilho das estrelas.
Até a lua se escondeu...
Como sentir saudade?
Como sentir saudade?
Saudade não se deseja,
Somos desejados por ela.
Saudade não se almeja.
Não se traça o quando
Nem por onde vai chegar.
Mostra sua face, se instala
E nem avisa ao se afastar...
De repente, estamos sós?
De repente, estamos sós?
Nem saudade existe mais?
(Um vento bate na porta,
A brisa sopra pela janela...
Passos ecoam na calçada.
Não ouço latido do cão,
A lua traz réstia de luz
E um beijo doce na face.)
A saudade foi se embora.
A saudade foi se embora.
Nem disse se vai voltar...
Tio, sehnsucht é uma palavra raramente usada em alemão. Inclusive, eu acho que só a ouço quando eu mesma a uso, traduzindo meus sentimentos brasileiros pra língua alemã. E hoje, assim como dona Iracema, tb senti saudade da minha mãe. Já se vão 15 anos sem ela, e eu tinha 19 quando do seu falecimento. Apesar disso, de eu ter vivido já quase uma outra metade da vida sem ela, o sentimento, a presença dela é constante, é imensa. A saudade traz as pessoas de volta pra gente, né? Nem que seja por alguns instantes. Tio, saudade de vocês também. Beijos!
ResponderExcluirLindinha, você é um anjo. Que delícia essa sua participação aqui no blog. Obrigado, de coração. Beijos.
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