Parece
pouca coisa, mas não é. Muito pelo contrário. Dedicar um dia, no âmbito internacional,
ao direito à verdade, é mais que restabelecer os fatos como foram e aconteceram.
É também preservar a memória e garantir justiça. Foi baseada nessa tríade –
Verdade, Memória e Justiça – que a Assembleia Nacional das Nações Unidas
estabeleceu, no ano de 2010, o dia 24 de março como o Dia Internacional do
Direito à Verdade.
Esse
direito se dá no contexto das violações graves dos direitos humanos. Foi concebido
para alcançar as vítimas e famílias de vítimas de execuções sumárias,
desaparecimentos forçados, tortura, desaparecimentos ou sequestro de menores, para
que seja alcançado o conhecimento completo sobre os atos que ocorreram, as
pessoas que participaram deles e as circunstâncias específicas, em particular
as violações cometidas e suas motivações.
No
Brasil, a data passou a fazer parte do calendário oficial comemorativo em 2018,
por meio da Lei nº 13.605/18, que dedica o dia 24 de março à “reflexão coletiva
a respeito da importância do conhecimento circunstanciado das situações em que
tiverem ocorrido graves violações aos direitos humanos, seja para a reafirmação
da dignidade humana das vítimas, seja para a superação dos estigmas sociais
criados por tais violações”.
Isso
posto, vamos ao desgosto. Os quatro anos do governo anterior são motivos de
sobra para valorizarmos ampla e exemplarmente o Dia Internacional do Direito
à Verdade. É preciso restabelecê-la em seus vários episódios, capítulos e
epílogos de uma trágica e esquizofrênica novela bolsonarista, desde os primórdios
até a última semana do mês de dezembro de 2022, com direito a fuga para a
Califórnia, recheada de brilhantes, diamantes, joias, relógios, colares,
canetas, broches, fuzil e pistola... Coisa de cinema.
Qual
é a verdade que vai brotar dos fatos, que seriam cômicos se não fossem trágicos,
ocorridos na pandemia da Covid-19? Familiares e amigos de quase 700 mil vítimas
não terão direito a saber exatamente por que tantas mortes ocorreram em um país
que tem sistema de saúde pública?
Um
SUS que, bem ou mal, garante atendimento básico aos mais humildes, mais
necessitados. Um país que sempre teve capacidade e desenvoltura para levar
adiante amplas, gerais e irrestritas campanhas de vacinação. Servindo de
exemplo para o mundo todo. Um povo capaz de seguir à risca orientações de ordem
sanitária, como evitar concentrações, fazer uso de máscaras, lavar e higienizar
as mãos com frequência.
Qual
a verdade que deverá ser levada aos habitantes originários desse imenso Brasil
quanto ao genocídio dos povos indígenas? A ampliação de garimpos ilegais, o
desmatamento desenfreado, as queimadas sistemáticas, a pesca clandestina, o desmantelamento
dos órgãos de fiscalização, o assassinato de lideranças e defensores dos povos
indígenas, tudo isso ocorreu por acaso?
Qual
a verdade devemos levar aos jovens sobre os ataques covardes, intensos e
frontais às instituições democráticas, ao estado democrático de direito, à
liberdade de imprensa e ao compromisso com os fatos, levados adiante nesses últimos
quatro anos e, de forma assutadora, no trágico 8 de janeiro?
Este
24 de março de 2023, em que se comemora o Dia Internacional do Direito à
Verdade tem um significado especial para o povo brasileiro. Nunca a verdade
esteve tão ausente quanto nos 1.460 dias que se iniciaram em 1º de janeiro de
2019 e foram findados em 31 de dezembro de 2022.
No
amanhecer de cada dia desses todos os dias, tinha uma pedra no meio do caminho.
No meio do caminho, tinha um pedra. E rolamos todos ladeira abaixo.
Falta resgatar pelo menos a verdade. Não seria pouco.
Quem viveu e sofreu os horrores da Ditadura valoriza a Democracia.
ResponderExcluirExatamente isso! Obrigado pela participação aqui no blog.
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