domingo, 27 de fevereiro de 2011

Quando a poesia toca o coração de uma mãe

Nesta manhã, pós Carnaval dos Amigos, só mesmo o texto sensível do poeta e desembargador Itaney Francisco Campos para começar o dia. Li e reli o poema Um Homem que Mata. É um texto belo e emocionante, mas a emoção maior ocorreu ao ler a carta de Sônia ao desembargador Itaney. Sônia teve um filho assassinado e se sentiu profundamente identificada com o poema. Na realidade, ela escreveu uma carta  não apenas ao desembargador, mas, de igual modo, ao poeta, sensível, observador - um cronista dos nossos tempos. Compartilho essas duas emoções com vocês.



Um Homem Quando Mata

Itaney Campos

Um homem, quando mata outro homem,
viola a esfera dos deuses,
penetra no reino obscuro
desse gesto absoluto
e  se incorpora a si mesmo
a ausência imanente do outro
atravessada em sua existência
como se fora uma faca
encravada em sua costela.
Incorpora ao seu nome o sobrenome
do morto, e quando come,
se alimenta da mesma fome
do outro. Quando bebe, bebe a sede
do semelhante rompido.
Os olhos cerrados do morto
vigiam os passos do insensato
e sua vida cresce nas sombras
sob os gritos perdidos do finado.
O remorso segue ao encalço
dos seus passos claudicantes.
O medo como erva daninha
prolifera em seus pensamentos.
Em sua fala de todo momento
escuta a voz de quem calou.
Um homem que mata destrói
no outro um pouco de si mesmo,
segue pelos círculos a esmo
como Prometeu cego e pendido
ao peso da sombra do morto.


Prezado Desembargador Itaney,
                      
Muito me honrou o fato de que, minha filha Chistiane (Corte Especial) ao comentar com o senhor de minha admiração por seu artigo (ou será poema?) intitulado "Um homem quando mata", senti-lo interessado em receber meu simples comentário.
Sou funcionária aposentada do TJ e mãe de três filhos, Christiane, Flávia e Daniel, este falecido tragicamente em 25 de janeiro de 2004, assassinado após uma discussão por um motivo banal. Seu assassino desferiu-lhe um tiro na perna e quando ele se virou para evadir-se do local, foi mortalmente atingido por um segundo tiro, este fatal, pelas costas. 
Gastei todos os meus recursos emocionais e financeiros com advogados para, após quase sete anos de luta, vê-lo ser absolvido em seu segundo julgamento (o primeiro foi anulado por unanimidade no TJ, já que o resultado foi contrário às provas contidas nos autos).
Desculpe a delonga sobre meu drama pessoal, mas era necessário para que o senhor sentisse o quanto me sensibilizou seu poema. Senti-me emocionada às lágrimas e intimamente vingada, já que até parecia um recado para mim ou algo que fora encomendado para minha pessoa.
As últimas palavras de meu filho foram dois gritos de "mãããe!" que feliz ou infelizmente não ouví. Foi dito pelas testemunhas na ocasião do júri. Escrito por suas maravilhosa inspiração e abençoadas mãos, lí que um homem quando mata, "em sua fala a todo momento, escuta a voz que se calou..."

Portanto, Dr. Itaney, agradeço as palavras que me chegaram aparentemente ao acaso, em um momento tão  significativo da minha vida.
Ví, naquele momento, a verdadeira condenação do assassino de meu filho. Condenado por seu próprio ato, condenado por seu remorso, condenado por Deus, já  que nas leis espirituais "um homem quando mata viola a esfera dos deuses..."
Que Deus o abençoe sempre com muita saúde, paz e sabedoria em seu trabalho e em sua maravilhosa carreira de escritor.
  
Obrigada, desembargador Itaney!
Sônia
  

Um comentário:

  1. Uma grande homenagem ao sensível coração materno, porque, por mais antigo que isso possa soar, amor incondicional é mesmo o amor de mãe. Segundo, a poesia é eterna e vital como é inerente à pessoa humana a sensibilidade. Terceiro, a mídia eletrônica, ao contrário do que parece, pode ser um veículo de amor e fraternidade, quando encontra um jornalista de alma de artista....abraços. Itaney

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