quinta-feira, 17 de julho de 2014

Dia de rezar pra São Curumim e de resgatar Castro Alves



Enquanto as florestas brasileiras tentam, desesperadamente, sobreviver ao ferro e ao fogo das máquinas e das queimadas, é de bom alvitre relembrar Castro Alves – um dos mais belos poetas da literatura brasileira. Curumim não tem dado conta de enfrentar o desmatamento por meio de queimadas, principalmente nas regiões de Mato Grosso e do Triângulo Mineiro, mais particularmente na área de Uberlândia.
A região do Mato Grosso é recordista em queimada de florestas, enquanto em Uberlândia, o recorde ocorre em vegetações.
Mas a destruição das florestas por meio das queimadas aumenta em todo o País. Em Goiás, o crescimento foi de cerca de 20% no ano de 2013 em relação a 2012. E a tendência é que piore ainda mais este ano quando chegar setembro. O monitoramento por satélite permite registrar forte impacto sobre o bioma da Amazônia, em consequência de queimadas. No período de poucas chuvas, as temperaturas atingem níveis altíssimos e o estrago nas florestas é devastador, irreversível.
Certa noite, sonhei que Curumim, o protetor das florestas, dizia mais ou menos o seguinte:


Não foi meu cabelo
Que fogo colocou
Foi fogo forte
De queimada
Que me alcançou

Nada, nada adiantou
Andar de contrário
Fogo não se enganou
O vento forte mudou
Meu cabelo avermelhou...
E tudo, tudo, acabou.


O melhor mesmo nessas horas é lembrar que hoje é o Dia de Proteção das Florestas, rezar pra São Curumim, ouvir uma boa música e recitar versos de Castro Alves. Quem sabe o vento muda e a história toma rumo novo.


A queimada
Castro Alves

Meu nobre perdigueiro!  vem comigo.
Vamos a sós, meu corajoso amigo,
Pelos ermos vagar!
Vamos lá dos gerais, que o vento açoita,
Dos verdes capinais n'agreste moita
A perdiz levantar!...

Mas não!... Pousa a cabeça em meus joelhos...
Aqui, meu cão!... Já de listrões vermelhos
O céu se iluminou.
Eis súbito da barra do ocidente,
Doudo, rubro, veloz, incandescente,
O incêndio que acordou!

A floresta rugindo as comas curva...
As asas foscas o gavião recurva,
Espantado a gritar.
O estampido estupendo das queimadas
Se enrola de quebradas em quebradas,
Galopando no ar.

E a chama lavra qual jibóia informe,
Que, no espaço vibrando a cauda enorme,
Ferra os dentes no chão...
Nas rubras roscas estortega as matas...,
Que espadanam o sangue das cascatas
Do roto coração!...

O incêndio — leão ruivo, ensangüentado,
A juba, a crina atira desgrenhado
Aos pampeiros dos céus!...
Travou-se o pugilato... e o cedro tomba...
Queimado..., retorcendo na hecatomba
Os braços para Deus.

A queimada! A queimada é uma fornalha!
A irara — pula; o cascavel — chocalha...
Raiva, espuma o tapir!
...E às vezes sobre o cume de um rochedo
A corça e o tigre — náufragos do medo —
Vão trêmulos se unir!

Então passa-se ali um drama augusto...
N'último ramo do pau-d'arco adusto
O jaguar se abrigou...
Mas rubro é o céu... Recresce o fogo em mares...
E após... tombam as selvas seculares...
E tudo se acabou!...



Nenhum comentário:

Postar um comentário