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O Azul Jolcelina ficou famoso no médio norte goiano |
Fantástica
essa crônica do amigo, desembargador, poeta, escritor e membro da Academia Goiana
Letras (AGL), Itaney Campos. Já vimos histórias parecidas serem narradas em
outras plagas, outras regiões interioranas, principalmente em acontecimentos
envolvendo personagens do universo da zona, não a rural, claro.
Pelas bandas do Machambombo – ou Machombombo ou Machimbombo – o córrego que banhava a nossa pequena Uruaçu, enquanto por seus caminhos passava água suficiente para engrossar o rio Passa Três, também surgiam por lá histórias como essa, mas, qualquer semelhança com a realidade é mera coincidência... Lembrando que a zona, na terrinha, era mais conhecida como "Fôia Seca".
Coincidências
ou não, deixemos que o mestre Itaney nos conte tudo no texto publicado abaixo.
Quer dizer, quase tudo...
Itaney F. Campos
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Itaney Campos |
– Acidente como!?! O que aconteceu? – gritou.
–
O carro dele, o Fusca, bateu e amassou a frente. Dizem que ele desmaiou e foi
levado pro hospital Santana! – respondeu o moleque.
–
Mas como foi isso, meu Deus, ele é motorista tão experiente! Chama um táxi pra
mim, Demazim, corre ali no ponto! Me chama um táxi!
Dez
minutos depois a mulher já estava no táxi, se dirigindo ao hospital. Seguia
aflita, temendo que a coisa fosse grave, e que seu enrabichado corresse risco
de vida. Esse tipo de coisa e a aflição no peito diziam lhe que era amor o que
sentia por aquele moço. Ele não merecia essa paixão, dizia pra si mesma, mas, isso não lhe acalmava o coração, que palpitava forte, como se previsse o pior.
Será
que ele quebrou o braço, ou a perna? Pior, será que bateu a cabeça? Mas um
detalhe dava um tom amargo à sua preocupação. Alguém comentou que ele estava
acompanhado de alguém. Uma mulher, talvez. Doía-lhe pensar que ele poderia
estar tendo um outro caso. Outro não, com ela não era só um caso...
Não,
podia ser uma cliente, uma parente. Pensou consigo mesma que o seu ciúme já
estava imaginando coisas. Mas isso era prova de que a sua ligação com ele era
de amor, de paixão, não era só um caso, uma transa sem compromisso. Embora não
morassem juntos, encontravam-se toda semana, ele frequentando sua cama e ela
rejeitando, quando podia, outros homens, pois sentia que ele era o homem da sua
vida.
Da
sua vida já um pouco longa, e sofrida. Há um ano era exclusiva dele. Ela, que
enfrentara tantos dissabores, desde que saíra de casa para livrar-se dos
assédios do padrasto; ela, que montara uma casa, acolhendo moças como ela,
rejeitadas ou assediadas; ela, que já se cansara de lidar com bêbados, soldados
arrogantes, velhos rabugentos e rapazinhos mimados, tinha nesse amante a ilusão
do companheirismo. A porta para sair da “vida de cabaré”.
Ele
era o baú em que guardava a fortuna do seu futuro. Inclusive fora ela quem dera a ele o Fusca
que ele usava no dia a dia. Um fusquinha reformado, azul claro, num tom
diferente, que o povo já chamava de “azul Jolcelina”, pois o povo é criativo,
metido a fazer gracinha de tudo.
Estava
matutando nisso quando o carro de praça chegou ao hospital. Pagou a corrida e
desceu apressada. Antes pode reparar que o Fusquinha, com arranhados novos e um
pequeno amassado no para-lamas, estava estacionado na sombra, ao lado da casa
de saúde. Desceu apreensiva. Pelo menos, o carrinho não teve danos graves. Teve
de trabalhar e economizar muito para comprar o fusca, que deu de presente ao
namorado.
Na
recepção do hospital, foi informada de que as condições de saúde do acidentado
eram regulares, mas por cautela fora determinada uma radiografia, para melhor
avaliação. Já as condições da moça inspiravam maior cuidado, por isso fora
levada a UTI.
–
Que moça? Estava com ele na hora do acidente? – indagou, ansiosa.
–
Sim, responderam. – A moça estava com ele, no carro, saindo para Niquelândia. E
como estava grávida, ficou em observação na UTI.
–
Segundo o prontuário, estava grávida dele, alguém esclareceu...
No
dia seguinte, o fusca apareceu com o para-brisa quebrado, os quatro pneus
furados e os dois para-lamas riscados e amassados, em suma, em condições
precaríssimas!
Ninguém, nem o motorista Baú, estranhamente, quis tomar providências sobre aquela pancadaria no Fusquinha. Um mês depois, o carrinho, reformado, voltou a circular na cidade, “guiado” pela mulher dama. A cor era a mesma: um azul clarinho a que o povo dera o apelido de azul Jolcelina. Baú sumiu por uns seis meses. Nunca mais foi visto, porém, a batucar, mentir e ouvir música na casa da madame Jolcelina, na zona boêmia, em Uruaçu.
Sou suspeito, mas gostei do comentário. A crônica pode ser subscrita por todos nós, geração 60/70 de Uruaçu. Rs
ResponderExcluirComo não apareceu o nome do titular do comentário, fiquei sem entender o "sou suspeito". E fiquei curioso... hehehe
ExcluirMuito bom kkkkkk a ira da mulher foi transferida toda para o fusquinha.
ResponderExcluirPois é, Rodrigo, sobrou pro fusca...
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