quarta-feira, 5 de dezembro de 2012

A arte de costurar uma poesia e as lembranças que ela nos traz


O psicólogo e poeta Ítalo Francisco Campos já foi citado mais de uma vez neste blog e entrevistado sobre as reações de uma mãe ao conteúdo de um poema (para ler, ou reler, clique aqui). Agora, ele acaba de lançar mais um livro, chamado Elegia, e nos presenteou enviando o poema Corte e Costura, que reproduzimos abaixo, acompanhado da bela canção Carrinho de Linha, na interpretação extraordinária de Teresa Cristina.
Esse tema da costura sempre me deixou fascinado. Desde criança, quando observava minha mãe costurando, junto à velha máquina Singer, que eventualmente se transformava em carrinho dirigido pelos sonhos de criança. O volante era a imensa roda que fazia funcionar a máquina, e o assento do carro era a placa que servia de pedal – nas máquinas antigas, os pedais, grandes, suportavam uma criança, sentada, confortavelmente.
A vida, como diz o poeta, é arte de costurar nossos panos e nossos planos, em meio aos nossos sonhos e esperanças. As costureiras, com seus trabalhos e suas artes, fazem parte do nosso imaginário. Levamos a vida, como diz o poeta Itaney Campos, irmão do Ítalo, “costurando, costurados, encostados nos cós, encalhados nos caos, de nossos casulos e nós...”.
Ítalo Campos lançou sua Elegia em Vitória, Espírito Santo. Vamos esperar que ele nos presenteie com o lançamento de mais esse livro aqui pelo Centro-Oeste, quem sabe em Goiânia, em Brasília, ou na nossa saudosa e sempre fulgurante Uruaçu.
Enquanto isso não acontece, vamos seguir costurando a vida, procurando acertar os pontos da melhor maneira possível...

Corte e costura
Ítalo Campos

Vivo de corte e costura
Dos meus panos e planos;
Indo como patho
Ao fundo do fundo,
Do lago que me reflete.

Vivo de corte e costura
Da letra que o ferrão
Me fez:  ifc, fic, cif,
Cfi, fci, amarrados
Entre si.
Refrão de sentidos
Enrolados em carretel.

Vivo de corte e costura
E, se mais costuro,
Mais me prendo,
Em camisa de força.
Remendo.

Se tudo corto,
Resto-me solto,
Sem nenhum sentido.
Bordeando o abismo.

Vivo de corte e costura,
Em ensaio, em treino,
Em artesanato.
Vivo em rastro, resto
E pathos.
Vivo por um fio.

Vivo costurando
Planos e panos,
Refletindo no lago
O que me reflete.

Vivo costurando,
Fazendo nós
Em borda e cós,
Estirando carretel.

Vivo de cortar sentidos
Amarrados em mim,
Remendando
Para não sumir.

Vivo bordando palavras,
Escrevendo sentidos,
Belos e sofridos
Amarrados por si.

Vivo pisando rastro,
Vivo costurando restos,
Vivo roto e pathos,
Equilibrando no fio

2 comentários:

  1. Borduras pontos finos,delicados,com linha forte, que bate no peito e estremece a alma.Cada verso um sentido completo. "É a dança do intelecto com as palavras" fascinando.As palavras tentam ser contidas, e as emoções sinceras encantam . Amigo Ítalo, esses mergulhos me levam às lágrimas...Belíssimo,PARABÉNS!

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