terça-feira, 10 de março de 2015

Chove lá fora e aqui dentro uma seca que não vai embora...



A chuva é uma dádiva que só agora com a crise hídrica algumas pessoas conseguem perceber. Foi preciso São Paulo, com todo extraordinário valor econômico, sentir-se abalado pela seca para que a água passasse a ser vista como um bem finito, e que precisa ser preservado. Não é mais, apenas, o Nordeste a sofrer a agrura de um longo e tenebroso período de seca, com consequente escassez e racionamento de água. É o Sudeste maravilha que agora está a enfrentar o dissabor.
Então, passamos a falar sobre preservação de mananciais, uso racional da água e a rezar mais para São Pedro. Chuva passou a ser um bem econômico e água, mais-valia. Se a migração de nordestino caiu por graça e glória do programa social Bolsa Família, agora também tem o estímulo de que não vale a pena trocar uma seca por outra.
Penso, logo existo, que a continuar nesse compasso ditado pelos últimos anos, teremos, bem antes do imaginado, a água como moeda de troca do mundo globalizado. Faço essas reflexões a olhar a chuva, lá fora, a cair mansamente, compassadamente... Como é lindo, romântico e, ao mesmo tempo, tão realista.



Como as regiões secas estão sendo ampliadas no mapa geográfico e as águas dos oceanos avançam sobre os continentes, não está longe o dia em que o sertão vai virar mar e o mar vai virar sertão, pra cumprir a profecia do beato que de muito sabia...
Esse pequeno vídeo da chuva caindo lá fora e essa saudade que não vai embora são pra estimular corações e mentes quanto ao valor da natureza... e tudo aquilo que ela nos oferece. Lá fora, chuva, água, plantas, orquídeas. Cá dentro, essa bela canção de Tom Jobim, na voz inesquecível de Elis Regina.
A natureza agradece, mas quem deveria ficar feliz mesmo são os homens, pobres mortais, cabisbaixos, eternamente a contemplar o próprio umbigo.

Chove. Há Silêncio
Fernando Pessoa, in "Cancioneiro"

Chove. Há silêncio, porque a mesma chuva 
Não faz ruído senão com sossego. 
Chove. O céu dorme. Quando a alma é viúva 
Do que não sabe, o sentimento é cego. 
Chove. Meu ser (quem sou) renego... 

Tão calma é a chuva que se solta no ar 
(Nem parece de nuvens) que parece 
Que não é chuva, mas um sussurrar 
Que de si mesmo, ao sussurrar, se esquece. 
Chove. Nada apetece... 

Não paira vento, não há céu que eu sinta. 
Chove longínqua e indistintamente, 
Como uma coisa certa que nos minta, 
Como um grande desejo que nos mente. 
Chove. Nada em mim sente...  


3 comentários:

  1. Que privilégio…o verde, a grama, a mensidão da chuva sobre as copas das arvores… e murmúrios de passarinhos…Acho que vou morar em Brasília…
    E essa canção de de Jobim, revestida da sonoridade do piano e da voz de Elis! E ainda falam mal da nossa terra e do nosso povo…A arte nos resgata a todos. Valeu, Joseph!!!

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    1. Bom demais da conta, não é, mestre Itaney? Venha para Brasília, traga a Leila, e vamos curtir a natureza e uma boa convivência. Abraço e obrigado pela participação.

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  2. Epa, esse poema de Fernando fala por si mesmo! Viva!

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