Vandré não ganhou o III Festival Internacional da Canção, realizado em 1968, mas conquistou o público, as ruas e o coração de gerações e gerações que se sucederam àquela noite histórica para a Música Popular Brasileira. Na saída, centenas de jovens cercaram o carro do cantor. Pediram que ele cantasse, e ele cantou. Talvez, a última vez com aquela dimensão e intensidade. Disse ali mesmo: "Isso está virando comício, por favor, me deixem ir embora".
Foi embora, não apenas daquele local. Começava, ali, uma nova peregrinação que o aproximaria mais do Vandré romântico, aquele do início da carreira, autodenominado Carlos Dias, em homenagem ao ídolo Carlos José. Logo, logo, Vandré passaria a cantar o amor e a paz, fortemente influenciado, no exílio, pela saudade de sua terra e pelos cantadores de festas e feiras do interior nordestino. Nascia, em 1973, ano de sua volta para o Brasil, o LP, lançado aqui pela Philips, Das Terras de Benvirá.
Lá pelos idos de 1976, salvo engano, quando estudava na UnB e morava na Asa Norte, encontrei-me com um grupo de amigos, que me disseram, mais ou menos, o seguinte: Zé, você perdeu, ontem, Geraldo Vandré estava no Zebrinha (bar da Asa Norte de Brasília). Era verdade, encontraram-no por lá, e o convidaram para uma prosa no apartamento dos irmãos Lúcio e Roberto. Pelo que ouvi dos amigos, pude concluir que havia perdido, sim, a oportunidade de conhecer um novo Vandré, que começava a tomar corpo naquela época. Mas, não tinha perdido a oportunidade – e nem teria como – de conhecer o Vandré dos anos 60.
Este - e também aquele romântico, sonhador - o cantor e compositor enterrou definitivamente no ano de 1978, quando o advogado Geraldo Pedrosa de Araújo Dias disse, em entrevista, que tinha inventado o Geraldo Vandré. Nascia, ali, um terceiro Geraldo, distante tanto das canções engajadas, quanto das românticas. Não iria cantar mais e nem subiria mais nos palcos para participar de shows.
Isso, até o fim de semana passado, quando, em São Paulo, a cantora Joan Baez conseguiu fazer com que ele subisse ao palco. Não cantou, mas declamou alguns versos e foi homenageado pela cantora e pelo público. Um momento histórico, que pode ser visto abaixo, num vídeo gravado de forma amadora por um espectador, mas denso e cheio de simbolismo.
Geraldo realmente enterrou pra sempre o Vandré. Justamente o autor de Pequeno Concerto que Virou Canção, que, em 1965, dizia o seguinte:
“Não, não há porque mentir/ou esconder a dor que foi maior/do que é capaz meu coração/não, nem há porque seguir cantando/ só pra explicar/não vai nunca entender de amor/quem nunca soube amar/ah, eu vou voltar pra mim/seguir sozinho assim/até me consumir/ou consumir toda essa dor/até sentir de novo o coração/capaz de amor”.
“Vós que vireis na crista da onda em que nos afogamos, quando falardes de nossas fraquezas, pensai também no tempo sombrio a que haveis escapado” (Bertolt Brecht).
Premonição pura. Vandré era assim. Simplesmente, um cantador das coisas que aprendeu a ver, ouvir, pensar e sentir a respeito do seu tempo, do seu lugar e da gente que vivia pelas terras do Benvirá. Pena que a mesma vida, complexa, que o fez assim, também o levou por caminhos diversos.
É, realmente, a vida não se resume a festivais.
Ótima postagem. Parabéns como sempre Ze Carlos. Selma
ResponderExcluirObrigado, Selminha. Sempre atenta com as coisas do blog. Valeu.
ExcluirJosé Carlos, estive no show da Joan baez aqui em Porto Alegre e foi emocionante demais qdo ela e nós cantamos a linda marselhesa brasileira.
ResponderExcluirSabe informar como consigo o livro de poesia que Vandré escreveu no Chile ou na França?
Imagino que deve ter sido lindo esse show da Joan Baez. Vou pesquisar sobre o livro de poesias do Vandré, assim que descobrir onde encontra-lo, aviso pra você. Obrigado pela participação.
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