quinta-feira, 11 de agosto de 2016

Versos que se tocam entre o corpo e a alma


Há quem não goste de falar sobre alma. Acredita que só o corpo e a mente são a razão do existir. Um tema profundo e delicado, só abordado com a dimensão precisa pelos filósofos. Mas, que é um tema interessante para a poesia, não tenho dúvidas. Carlos Drummond, falando do amor, desafiou “quem ousará dizer que ele é só alma/ quem não sente na alma o corpo expandir-se/ até desabrochar em puro grito/ de orgasmo, num instante infinito”.
Clarice Lispector foi mais longe e chegou a refletir sobre o peso que a alma tem, nesses versos de extraordinária beleza:

“Minha alma tem o peso da luz. Tem o peso da música.
Tem o peso da palavra nunca dita, prestes quem sabe a ser dita.
Tem o peso de uma lembrança. Tem o peso de uma saudade.
Tem o peso de um olhar. Pesa como pesa uma ausência.
E a lágrima que não se chorou.
Tem o imaterial peso da solidão no meio de outros. ”

(Clarice Lispector)


Os poetas são assim: enxergam a leveza do corpo e a materialidade da alma na imensidão da vida, do universo e dos sonhos. Ou conseguem sentir a dificuldade de se amar pela alma. Como Manuel Bandeira nesse belíssimo poema abaixo:

Arte de Amar
Manuel Bandeira

Se queres sentir a felicidade de amar, esquece a tua alma.
A alma é que estraga o amor.
Só em Deus ela pode encontrar satisfação.
Não noutra alma.
Só em Deus - ou fora do mundo.

As almas são incomunicáveis.

Deixa o teu corpo entender-se com outro corpo.

Porque os corpos se entendem, mas as almas não.


De corpo e alma
José Carlos Camapum Barroso

Amor é encontro de almas
Por águas calmas, profundas.
Um bater leve de palmas
A ressoar pelo mundo.

Atritos que geram faíscas
São desafio contínuo:
Se um trisca, o outro pisca,
O mundo torna-se vazio!

Pulsar diário, quântico!
Ondas desaguam na baía
E um toque romântico
Faz o levitar da travessia!

Em Deus, amor extremo,
Alma e corpo nus estão.
A graça do ser Supremo
Consola na solidão.

Riscos mundanos, eternos,
Entes celestes sem fim...
Nos pulsares incertos,
Corpo e alma dizem sim!

Em suave harmonia,
Coro de poetas a cantar,
Luz nova que alumia
Bandeira a desfraldar...

Amor de corpo e alma:
Terra, Fogo, Água e Ar.

(Para Manuel Bandeira)



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