Brasília vive em mim e vivo sob suas asas há 47 anos, quase meio século. Aquele ano de 1973 foi marcada pela tragédia de Ana Lídia, mas, tudo era belo e puro naquele horizonte de céu imenso e tardes resplandecentes quando por aqui cheguei.
Nem tudo era
tragédia, embora vivêssemos ainda sob o manto escuro e obscuro de uma ditadura sangrenta
e opressora. Amigos presos, amigos sumindo, e o povo ansioso por uma luz no fim
do túnel.
Nos anos de 1970 o
Lago Paranoá fedia em uma cidade ainda não afetada pela poluição do ar e dos
seus rios e córregos. Até sua completa despoluição no final da década, o lago
estava longe de ser uma opção de lazer e entretenimento.
Essas e outras tragédias
marcaram a cidade que nunca perdeu a marca da esperança e dos sonhos de milhões
de brasileiros. Perdemos nosso fundador e criador Juscelino Kubitschek, depois
Tancredo Neves que encarnava o sonho da democratização.
Foi aqui que me
formei e exerci, e ainda exerço, orgulhosamente a profissão de jornalista, tão
ameaçada e incompreendida atualmente. Nessas mesmas Asa Sul e Norte constitui
família e criamos nossos filhos, em uma cidade tida “como o melhor lugar do
mundo para se criar os filhos”.
Brasília sempre foi
fascinante pela capacidade de acolher e abrigar quem a procurasse. Um dom que
ela já irradiava desde antes mesmo de existir, quando os raios de aconchego
brilhavam da Cidade Livre.
A cidade cresceu. Superou todos os desafios, embalada pelo horizonte musical de serestas, sambas, chorinhos e as tão promissoras bandas de rock. Atravessou décadas criando, recriando e se reinventando num mundo cada vez mais moderno e tecnológico.
Atravessou o século,
o milênio, e chegou incólume, garbosa e sempre gentil aos anos de 2020. Agora, sexagenária,
mostra ares de amadurecimento sem perder sua natural juventude, jamais.
Assim como o mundo todo,
os cinco continentes e dezenas de países, Brasília comemora seus 60 anos de
existência sob o signo ameaçador e onipresente do coronavírus. Nós, candangos,
seus filhos, que já são muitos, seus visitantes, transeuntes, vivemos uma mesma
e cruel realidade. É preciso isolar-se socialmente, afastar das pessoas que
amamos, recusar abraços e apertos de mãos que sempre marcaram a existência dessa cidade.
Brasília assiste
seus entes queridos adoecerem, se isolarem e morrerem. Os fins de tarde, os alvoreceres
tão famosos, o céu de Brasília e a luminosidade de um horizonte de sonhos e esperanças
estão ofuscados, à meia luz, à espera de um novo sonho de Dom Bosco, de onde
possam transbordar mel e bálsamo para dores que teimam em não se aplacarem.
A cidade dos sonhos
enfrenta mais um pesadelo sem perder a esperança e agarrada à missão para a qual
logrou existir: somos o futuro e ele ressurgirá no amanhã.
Brasília é o que
somos, o que plantamos e o que colhemos.
Obrigado, Brasília.
De coração.
Superquadras
José Carlos Camapum Barroso
Quadras quadradas,
Retângulos obtusos,
Saídas em círculos
De retas infinitas...
Triângulo (in) vértice,
Curvas imaginárias,
Onde paralelas finitas
Enfim se encontram
Entre duas asas.
Povo e povoado
Distantes do amanhã.
Casa e casebre...
Longe, perto, edifício...
Um mato que mata
Um sonho, pesadelo.
Árvore arvoredo...
De buscar bem cedo
Antes que o retorno
Sombrio da noite
Tire o Eixo dos eixos.
Brasília em brasa.
Círculo do circo
Que teima em circular.
Brasília de traços
Vistos do horizonte...
Hoje ainda de manhã,
Belas tardes de ontem.
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