Ciro Monteiro é uma das mais belas páginas da história da música brasileira. Cantor de extraordinário talento, além de afinado, tinha ritmo e um jeito particularíssimo de cantar, principalmente pela capacidade de oscilações em torno da nota (vibrato) e de brincar com a divisão rítmica. É exaltado até hoje por todos que o conheceram, por ter sido boa pessoa, bom caráter e simpático.
Imortalizou o uso da caixinha de fósforo no acompanhamento do samba, que virou sua marca registrada. Era sobrinho de Nonô, que acompanhava Sílvio Caldas e foi um dos mais famosos pianistas do Rio de Janeiro. Entre os sobrinhos conhecidos, Ciro teve Andiara, Araken, Moacir e Cauby Peixoto.
Além da música, sua paixão também era o futebol – flamenguista roxo. Conta-se que ele se gabava de ser liberal, ao deixar seus filhos escolherem, livremente, por qual clube iriam torcer. Fazia, seguidamente, o seguinte teste com os filhos que começavam a ficar grandinhos.
Punha, em cima da mesa, dezenas de flâmulas de futebol para que a criança escolhesse, democraticamente, qual seria o seu time. Aquela que ela retirasse, corresponderia ao clube do seu coração dali pra frente. Contava essa história com muito orgulho, depois, suspirava, e dizia: “ainda bem que lá em cima da mesa, eu só punha flâmulas do Flamengo...”
Quando nasceu Sílvia, a filha de Chico Buarque e Marieta Severo, Ciro Monteiro deu-lhe de presente o manto sagrado: a camisa do Flamengo. Chico, torcedor apaixonado do Fluminense, deu o troco, ao compor uma música pra que Ciro gravasse.
Mas, deixemos que o próprio Ciro conte essa história engraçadíssima e curiosa, nessa relíquia de vídeo abaixo. No ano de 1972, em uma mesa de bar, ao lado da exuberante Elke Maravilha e da cantora Carminha Mascarenhas, com Lúcio Alves e Sérgio Cabral também na mesa, o cantor, no seu estilo bem carioca, conta como nasceu a música Receita para Virar Casaca de Neném, e a interpreta com todo seu talento. Confiram e vejam a letra.
Ilmo Sr. Ciro Monteiro ou
Receita Pra Virar Casaca de Neném
Ciro Monteiro
Composição : Chico Buarque
Amigo Ciro
Muito te admiro
O meu chapéu te tiro
Muito humildemente
Minha petiz
Agradece a camisa
Que lhe deste à guisa
De gentil presente
Mas caro nego
Um pano rubro-negro
É presente de grego
Não de um bom irmão
Nós separados
Nas arquibancadas
Temos sido tão chegados
Na desolação
Muito te admiro
O meu chapéu te tiro
Muito humildemente
Minha petiz
Agradece a camisa
Que lhe deste à guisa
De gentil presente
Mas caro nego
Um pano rubro-negro
É presente de grego
Não de um bom irmão
Nós separados
Nas arquibancadas
Temos sido tão chegados
Na desolação
Amigo velho
Amei o teu conselho
Amei o teu vermelho
Que é de tanto ardor
Mas quis o verde
Que te quero verde
É bom pra quem vai ter
De ser bom sofredor
Pintei de branco o teu preto
Ficando completo
O jogo da cor
Virei-lhe o listrado do peito
E nasceu desse jeito
Uma outra tricolor
Amei o teu conselho
Amei o teu vermelho
Que é de tanto ardor
Mas quis o verde
Que te quero verde
É bom pra quem vai ter
De ser bom sofredor
Pintei de branco o teu preto
Ficando completo
O jogo da cor
Virei-lhe o listrado do peito
E nasceu desse jeito
Uma outra tricolor
Só mesmo o Chico prá compor esse samba genial! Tá certo que não funcionou muito, pq a filha virou flamenguista..mas em compensação, Ciro recebeu a pecha de "aliciador de menores". São as estórias maravilhosas da MPB...
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