terça-feira, 14 de agosto de 2012

Rio Vermelho que passa mas permanece em Goiás Velho

 O Estado de Goiás é a nossa terra e temos orgulho de suas tradições e de sua gente. Goiás, a cidade, antiga capital do Estado, que se chamou Nossa Senhora de Santana e depois Vila Boa, é a nossa relíquia e o depositário da nossa memória goiana, de uma riqueza cultural invejável no universo de escritores, poetas, músicos e artistas plásticos. Por essa cidade, fundada em 1727, nós goianos temos um carinho todo especial e falamos dela como se falássemos de nossa própria cidade.
Mestre Itaney, poeta, desembargador e amigo, numa de suas andanças por aquelas paragens, escreveu um texto delicioso sobre o Rio Vermelho, que passa pela cidade, mas, ao mesmo tempo, nela permanece, pois é fonte perene de inspiração e não nos deixa esquecer seu passado, seus artistas e sua história.
Itaney traz em seus versos a lembrança do poeta goiano Felix de Bulhões, jornalista, abolicionista, que também exerceu a magistratura. Relembra Nhanhá Couto, a antiga professora da cidade, e também Cora Coralina, a mais renomada poeta goiana, a quem já rendemos nossas homenagens aqui no blog. Mostra também um pedaço de nossas origens uruaçuenses, ao citar Joaquim Fernandes de Carvalho – irmão do Coronel Gaspar Fernandes, este fundador de Uruaçu e aquele um cidadão respeitado, que deixou Niquelândia para residir em Vila Boa, onde presidiu a Assembléia Constituinte.
E assim, entre palavras e versos, no ritmo próprio das águas do Rio Vermelho, o poeta segue versejando sobre essa cidade maravilhosa, sua gente e suas memórias. E resgata o poeta Manoel Amorim Felix de Souza, que compôs a letra e a música de Rio Vermelho, essa modinha inesquecível, aqui interpretada pela bela voz de Maria Augusta Calado, a mais expressiva cantora goiana, professora e musicóloga (para ler mais sobre ela e sobre modinhas, clique aqui).
Também, já escrevemos demais. Deixemos que os versos de Itaney e a canção de Manoel Amorim falem por si só.
Esse jeito goiano de ser é bom demais da conta!


O rio desta cidade
Itaney Campos

          (Para Antônio Celso R. Jubé)


Nesta cidade de sombras e silêncio,
Em que o tempo se fixou, imobilizado;
Nesta cidade de igrejas, casarios, ruas de pedras
E becos desertos,
Passa um rio que vem de séculos passados. 

Passa um rio de poesia, de melancolia e quietude.
Passa um rio que não passa, permanece,
Com seus lamentos e segredos,
Rio de poucos peixes e muitas lavadeiras...
Rio de meninos e muito cascalho que já foi ouro.

Nesta cidade, ainda que forasteiro,
Faço-me residente, liquefeito e prisioneiro,
Em busca dos antepassados,
Desses vultos que navegam feito espumas,
Feito plumas nas correntes
Desse escasso ribeirão.

No leito desse rio que escorrega
Feito lépida serpente
Por entre escarpas rochosas
E seixos e bancos de areia,
Escavo as raízes do nosso povo calado,
Descubro a memória das rezas
Que nascem das sombras da noite,
Os lamentos que se escutam
Nos corredores dos velhos sobrados.

Nas águas desse rio visito
A memória de Joaquim Fernandes,
O severo mestre-escola,
De que já ninguém se recorda.
Oculto, por entre as cortinas,
Absorvo o verbo libertário
Do poeta Felix de Bulhões. 
No murmúrio do córrego escuto
Os versos pungentes de Cora;
Ouço os acordes do piano 
Da professora Nhanhá do Couto,
A fluir como um rumor de asas
Por longas varandas e salas obscuras.  
Aqui, disfarçado vivente,
Observo Veiga Vale a esculpir
Os seus querubins de madeira,
De ares tão piedosos.

O rio é um espelho vivo, um sobrevivente,
Que cristaliza o tempo,
E reverbera as luzes douradas
Da areia da Serra que Goiandira
Transplantou, mágica, para as telas. 

E embora pareça inverossímil,
Este plácido córrego já se encheu
De fúria colérica, e indomável
Desvastou impiedoso
Casas, barrancos, pontes e troncos
Quando o quiseram aniquilar.
             
No entanto, regularmente
O seu burburinho emerge
Em feitio de oração,
Como se entoasse as modinhas 
De Manoel Amorim Felix e Sousa, 
Poeta travestido em julgador
Que dialogava com os anjos.     

O rio se evapora em canções
Que retornam à luz da manhã
Liquefeitas em rezas e mistérios;
E escorrem por seus barrancos
A engrossar suas correntes
A represar os seus remorsos.
O rio recolhe em seu fluir
As histórias fabulosas do tempo,
A glória transitória da vida,
A memória efêmera dos mortos.

                        (jan/2012)




3 comentários:

  1. Que belas fotos, bela música, e o poema do nosso amigo Itaney...maravilhoso ! É Goiás, há que lhe traga para ser visto e admirado,foi Cora para o Paraíso, mas outros surgem não lhe deixando sem imagem, sem poesia,nem sem música . Maravilha ! Aplausos de Pé !!!

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  2. Preciso com urgência da letra da música RIO VERMELHO. Agradeço a quem me enviar. Meu e-mail é: marineumaoliveira@gmail.com. Obrigada.

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    1. Marineuma, já encaminhei a letra por e-mail. Obrigado pela sua participação no blog.

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