terça-feira, 26 de abril de 2011

Sonhos de um horizonte que não é mais tão belo



Pouco acima do cruzamento da Rua dos Guajajaras com a Rua São Paulo, no número 750, em Belo Horizonte, vivi sonhos e fantasias de uma adolescência que não acabaria jamais. Por ali passaram amigos e amigas, colegas de escola e de pensão. Os sonhos eram tão fortes que mal enxergávamos a realidade dos anos tão cruéis da ditadura militar, que matava e torturava sob o silêncio imposto pela censura aos veículos de comunicação.
Ah, sim! Tínhamos o Pasquim, que nas linhas e nas entrelinhas, nos traços de tantos talentos, nos dava o alento de poder respirar e sonhar com novos tempos.
Belo Horizonte ainda tinha um horizonte razoavelmente belo. Tinha a vida noturna que, com o passar dos anos, revelaria aos brasileiros uma tradição de botecos de qualidades etílicas e culinárias incomparáveis. Tinha os mesmos Atlético, Cruzeiro e América a exalarem paixões pelo belo Mineirão e pelas ruas de BH afora.
Na verdade, não é o tempo que destroi sonhos e lembranças. Quem os extingue são os homens com suas ambições desmedidas e incontroláveis.
O velho sobrado 750 da Guajajaras, entre Rio de Janeiro e São Paulo, nada mais é do que o número 740, com um muro pixado, um portão de metal enigmático, coberto por ameaçadora cerca elétrica, que protege... Ninguém sabe dizer bem o quê. O velho e tradicional colégio Anchieta não passa de mais um estacionamento entre centenas que estacionaram pelas ruas da cidade, entre prédios e engarrafamentos.
Quem sobreviveu, e sobreviverá por muitos e muitos anos ainda, é o Mercado Central, na esquina da Rua Curitiba com Augusto de Lima. Esse tem gente, povo, sonhos e não sucumbe à ânsia da modernidade. É um patrimônio histórico desde 1929.
Não tive tempo de ver e conferir outros pedaços da minha história belorizontina. Se esse locais evoluíram, regrediram, ou simplesmente foram extintos, não sei.
Mas, felizmente, foi possível verificar que o povo mineiro continua, na sua mineiridade, maravilhosamente hospitaleiro. Não apenas porque estávamos em casa, acolhidos por familiares, mas principalmente porque essa é essência da alma mineira, com seu jeitinho manso, prosa boa e falar bonito.
Aquilo que é do povo, e está arraigado em sua cultura, resiste às ambições do progresso e faz ressuscitar os sonhos. Assim como Jesus Cristo voltou à vida no sábado. Aleluia.


4 comentários:

  1. Excelentee essa crônica reminiscência de BH. Vc passeia pela cidade com olhos amorosos, mas sem perder o senso crítico. E diz, com sabedoria, que não é o tempo que destrói nossos sonhos e referências, mas a ganância desmedida e incontrolável dos homens. Esse elogio aos mineiros soa também como algo de sabedoria, de verdade que o tempo só vem confirmar...afinal, é a terra de Drummond, de Guimarães Rosa, de outro Guimarães, o Alphonsus, e de João Bosco, Milton e Wagner Tirso...É muita gente boa, né não?

    ResponderExcluir
  2. Zeca, você tem que ir ao Museu Inhotim, a 40km da cidade (em Brumadinho). Foi o museu mais bonito a que já fui na minha vida. É realmente impressionante o lugar, único. Abração, Matheus.

    ResponderExcluir
  3. Estive em BH para um encontro Nacional do PCB, foi aí que uma escapulida para ver o Atlético X Cruzeiro no Mineirão me emocionou.Estádio lotado ! Ditadura e futebol é o que rolava . Mas os Brasileiros conquistram a Democracia, agora é o que importa . E os mineiros é quase que nem nóis né sô ??!!! BH agora é terra amada por Adélia e Dinis.E uma vida cultural intensa, quero passear mais por lá. Valeu a lembrança da Guajajaras.

    ResponderExcluir
  4. Que crônica mais linda! Não tive a oportunidade de conhecer BH antigamente, mas mesmo sendo uma selva de pedras, ela ainda me encanta de alguma forma. Talvez seja modo mineiro de viver a vida, sem stress e preocupações. Parabéns pela crônica!
    Luara Nunes

    ResponderExcluir